quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

São João da Cruz

São João da Cruz

São João da Cruz (1542-1591) foi um frade clérigo carmelita espanhol, um grande místico, reformador do Carmelo junto a Sta. Teresa D’Ávila, além de ter recebido o título de Doutor da Igreja, pelo Papa Pio XI.

Teve uma infância pobre, mas desde cedo se empenhou em aprender e trabalhar. Foi carpinteiro, alfaiate, pintor, entalhador, entregador, ajudante de enfermeiro e acólito. Recebeu educação em colégios de religiosos, estando desde a infância imerso na religião católica.

Recebeu em 1563 o hábito do Carmelo, sob o nome de Frei João de São Matias, fazendo no ano seguinte sua profissão religiosa. Entre 1564 e 1568 estuda na Universidade de Salamanca (matriculando-se na primeira vez como artista, e na segunda como presbítero e teólogo) e é ordenado sacerdote em 1567, mesmo ano em que conhece Teresa D’Ávila, e com ela inicia a reforma* no Carmelo.

Sua vida na Ordem Descalça foi de constante missão, indo onde a Providência Divina o mandava, assumindo os cargos que o Senhor lhe confiava, trabalhando para que se estabelecesse e crescesse esta ordem. Foi incompreendido, perseguido, aprisionado, caiu enfermo, mas jamais deixou de cumprir a vontade de Deus. Deixou muitos escritos, os quais são de extrema riqueza e atravessam o tempo, servindo de auxílio aos que querem desapegar-se do seu eu e seus apetites, e deixar-se guiar pela Cruz de Jesus, único caminho da Salvação. O santo faleceu em 14 de Dezembro de 1591, aos 49 anos.

Em suas poesias, cânticos espirituais, ditos e demais escritos, o santo fala do desapego, da renúncia, do abandono e da aceitação da cruz e de tudo aquilo que é desagradável ao humano, para se chegar à perfeição: “Renuncia aos teus desejos e encontrarás o que deseja o teu coração.” Fala dos estágios da santidade, explica que é preciso entrar em si mesmo para ir em direção a Deus, abandonando as camadas mais externas e sensíveis do corpo e da alma, passíveis da interrupção e contaminação mundanas. São João da Cruz nos ,mostra a Noite Escura, um estado de aridez espiritual, privação dos sentidos e das consolações, pelo qual passam todas as almas que estão se adiantando no caminho da perfeição, na Subida do Monte. É um período de graça, não de tibieza. Ele nos mostra que a alma deve ser esposa de Cristo, deve se enamorar completamente dEle, a fim de querer e conseguir unir-se a ele, pois como fogo que converte tudo em fogo, o que Deus pretende é fazer-nos deues, isto é, nos resgatar e nos devolver àquela imagem e semelhança (Cf. Gênesis 1, 26) perdida pelo pecado. Subindo o monte da perfeição, a alma torna-se uma com Deus, sendo-o ele por participação.

Alguns escritos de São João da Cruz:

Acerca da Santíssima Trindade – A Criação

Áudio: “Divino Diálogo” Ir. Kelly Patricia


Uma esposa que te ame,
Meu Filho, dar-te queria,
que por teu valor mereça
estar em Nossa companhia,
e comer pão numa mesa
do mesmo que Eu comia,
para que conheça os bens
que em tal Filho Eu possuía.
E se congrace comigo
por Tua graça e louçania.
- Muito te agradeço, Pai
- o Filho lhe respondia. -
À esposa que me deres,
minha claridade Eu daria,
para que por ela veja
quanto Meu Pai valia,
e como o ser que possuo
do seu ser o recebia.
A encostarei ao Meu braço
e em Teu amor se abrasaria,
e com eterno deleite
Tua bondade exaltaria.

Noite Escura

Áudio: “Noite Escura–Partes I e II” Ir. Kelly Patricia (

1. Em uma noite escura,
De amor em vivas ânsias inflamada,
Oh, ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Já minha casa estando sossegada.
2. Na escuridão, segura,
Pela secreta escada, disfarçada,
Oh! ditosa ventura!
Na escuridão, velada,
Já minha casa estando sossegada.
3. Em noite tão ditosa,
E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa,
Sem outra luz nem guia
Além da que no coração me ardia.
4. Essa luz me guiava,
Com mais clareza que a do meio-dia
Aonde me esperava
Quem eu bem conhecia,
Em sítio onde ninguém aparecia.
5. Oh! noite que me guiaste,
Oh! noite mais amável que a alvorada!
Oh! noite que juntaste
Amado com amada,
Amada já no Amado transformada!
6. Em meu peito florido
Que, inteiro, para ele só guardava,
Quedou-se ali adormecido,
E eu, terna, o regalava,
E dos cedros o leque o refrescava.
7. Da ameia a brisa amena,
Quando eu os seus cabelos afagava,
Com sua mão serena
Em meu colo soprava,
E meus sentidos todos transportava.
8. Esquecida, quedei-me,
O rosto reclinado sobre o Amado;
Tudo cessou. Deixei-me,
Largando meu cuidado
Por entre as açucenas olvidado.

Subida do Monte Carmelo

Áudio: “Subida do Monte” Ir. Kelly Patricia (Letra adaptada)

“Para chegares a saborear tudo,
não queiras ter gosto em coisa alguma.
Para chegares a possuir tudo,
não queiras possuir coisa alguma.
Para chegares a ser tudo,
não queiras ser coisa alguma.
Para chegares a saber tudo,
não queiras saber coisa alguma.
Para chegares ao que não gostas,
Hás-de ir por onde não gostas.
Para chegares ao que não sabes,
Hás-de ir por onde não sabes.
Para vires ao que não possuis,
Hás- de ir por onde não possuis.
Para chegares ao que não és,
Hás-de ir por onde não és.
[…]Quando reparas em ALGO – deixas de lançar-te ao TUDO
Porque para vir de TODO ao TUDO – hás de tê-lo sem nada QUERER
E quando o venhas de TODO a ter – hás de tê-lo sem nada QUERER
Porque se queres ter algo em TUDO – não tens puro em Deus o teu tesouro.
Nesta desnudez encontra o espírito o seu descanso, pois nada cobiçando, nada o impele para cima e nada o oprime para baixo, porque está no centro da sua humildade."

Santa Teres D'Ávila*A “reforma” no Carmelo consistia, em linhas gerais, numa reestruturação do modelo de vida e dos monastérios carmelitas, com a intenção de aproximar ainda mais o carisma carmelitano à imitação de Cristo. Entre as mudanças pode-se salientar a formação comunidades menores de religiosos, estreitando os laços entre os consagrados e permitindo um melhor controle; a intercalação de momentos de convívio com momentos de reclusão e oração; a ausência de uma renda fixa, dando lugar à dependência das doações dos fiéis e da Misericórdia Divina. Tal reforma resultou numa nova ramificação da Ordem do Carmo, da Ordem dos Carmelitas Descalços, tendo Sta. Teresa D’Ávila e São João da Cruz como principais fundadores, sendo São João o primeiro padre Carmelita Descalço.

Referência: Obras Completas. São João da Cruz. 7ed. 2002. VOZES.

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